A pandemia do coronavírus tornou ainda mais difícil a situação das pessoas que fogem de guerras, conflito e perseguição. Enquanto os países focam em proteger suas populações e economias, normas fundamentais das leis de refugiados e direitos humanos estão em risco. A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) estima que 167 países fecharam suas fronteiras total ou parcialmente para conter a propagação do vírus. Pelo menos 57 Estados não estão abrindo exceção para pessoas que procuram asilo. Com a continuação das guerras e da violência em diversas partes do mundo, essas medidas violam o direito das pessoas de solicitar refúgio. Aqueles que buscam segurança e abrigo estão sendo rejeitados nas fronteiras terrestres ou marítimas e devolvidos ou transferidos para outros países onde podem enfrentar sérias ameaças à sua vida ou liberdade (ACNUR, 2020).
O ACNUR vem pedindo aos governos que administrem as restrições nas fronteiras de maneira que também respeitem os padrões internacionais de direitos humanos e proteção de refugiados- por meio de quarentenas e exames de saúde. As medidas de quarentena podem, por exemplo, ser uma restrição legítima ao direito à liberdade de circulação, desde que atendam aos padrões internacionais de direitos humanos, aplicadas de maneira não discriminatória. Por outro lado, as preocupações com a saúde não justificam o uso sistemático ou arbitrário das detenções de imigrantes (ACNUR, 2020).
Como tem sido amplamente divulgado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), lavar as mãos com água e sabão é essencial pára impedir que o coronavírus continue se espalhando. Além disso, o isolamento social é necessário e tem se mostrado extremamente eficaz para diminuir o pico no número de casos e evitar o colapso dos sistemas de saúde. Em campos de refugiados ao redor do mundo, a falta de acesso à água potável gera a proliferação de doenças que podem ser mortais, como a cólera. Segundo relatório da ONU (2019), doenças causadas por água suja e falta de saneamento básico matam mais pessoas a cada ano do que todas as formas de violência, incluindo guerras. Sendo assim, este é um problema de saúde urgente.
Segundo um relatório da ACAPS (2020), organização independente de análises humanitárias internacionais, a densidade populacional dos 34 campos de refugiados em Bangladesh é de 40 mil pessoas por quilômetro quadrado. Isso é mais de seis vezes a concentração existente em Wuhan, na China, onde a pandemia de coronavírus começou. Bangladesh é o país que abriga um dos maiores campos de refugiados do mundo, o Cox’s Bazar. Lá vivem cerca de 855 mil rohingyas, uma minoria muçulmana perseguida em Mianmar, país vizinho. O Líbano, além do covid-19, também passa por sérios problemas. A explosão no porto de Beirute, capital do país, ameaça provocar um grave desabastecimento de alimentos e outros insumos básicos, que abriga hoje a maior concentração de refugiados do mundo. Segundo dados do ACNUR, 98% do total de refugiados em território libanês são sírios, e há também um contingente de palestinos no país. Os 928 mil expatriados equivalem a 13,6% da população do Líbano.
O polêmico caso dos refugiados deixados em alto mar pela Grécia teve desdobramentos. A denuncia foi feita por ONGs e pela ACNUR, que descreveram que os refugiados foram deixados em alto mar por um longo período de tempo. Dois dias após as acusações, a Primeira Ministra da Grécia negou as acusações e as apontou como “desinformações”. Porém, o especialista em direito internacional François Crépeau afirmou que “o coronavírus ofereceu uma janela de oportunidade para a Grécia fechar as fronteiras nacionais para quem eles quiserem” (France 24, 2020). E os outros Estados da União Europeia? O ministro de Desenvolvimento alemão, Gerd Müller, alertou sobre uma nova onda de refugiados na Europa, caso a Comissão Europeia não disponibilize mais fundos para combater as consequências da pandemia do coronavírus nos países em desenvolvimento. O ACNUR pediu ao governo alemão que faça da proteção aos refugiados uma das prioridades, mesmo em tempos de pandemia. A Alemanha assumiu recentemente a presidência rotativa da União Europeia e o ministro do Interior alemão, Horst Seehofer, anunciou que almeja uma reforma do sistema de concessão de refúgio na União Europeia durante os seis meses na presidência do bloco- o ministro planeja transferir a decisão sobre solicitações de refúgio para as fronteiras externas do bloco Europeu, com o intuito de tentar reduzir o número de refugiados que entram no bloco (DW, 2020).
Na América Latina, a crise de coronavírus afetou produndamente os mais de cinco milhões de venezuelanos que deixaram seu país e agora vivem em outros países da América Latina e do Caribe. A pandemia e suas medidas de contenção deixaram grande parte dos refugiados e migrantes trabalhadores da economia informal sem renda e sem acesso a serviços básicos. Segundo a UNICEF (2020), muitos deles se encontram nas ruas, passando fome e vivendo ao ar livre- além disso, meninos, meninas e mulheres correm o risco de serem expostos à exploração e abuso. No Brasil, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) emitiu uma nota técnica com sugestões ao Governo do Distrito Federal (GDF) para que sejam implementadas políticas públicas que garantam aos imigrantes e refugiados acesso aos projetos e ações criados para reduzir os efeitos da pandemia no Distrito Federal- foi sugerido a disponibiliação de informações traduzidas nos principais idiomas usados pelas populações migrantes sobre direitos e o acesso à saúde pública, à rede socioassistencial e de enfrentamento à violência contra a mulher (MPDFT, 2020).
ACNUR. Direitos humanos dos refugiados devem ser garantidos durante pandemia. 2020. Disponível em: https://nacoesunidas.org/acnur-direitos-humanos-dos-refugiados-devem-ser-garantidos-durante-pandemia. Acesso em: 20 ago. 2020.
ACAPS. #COVID19. 2020. Diponível em: https://www.acaps.org/projects/covid19. Acesso em: 20 ago. 2020.
DW. Alemanha alerta para nova onda de refugiados devido à pandemia. 2020. Disponível em:
https://www.dw.com/pt-br/alemanha-alerta-para-nova-onda-de-refugiados-devido-%C3%A0-pandemia/a-54011278. Acesso em: 23 ago. 2020.
FRANCE 24. UN, rights groups accuse Greece of using pandemic to ‘step up’ migration restrictions. 2020. Disponível em:
https://www.france24.com/en/20200823-un-rights-groups-accuse-greece-of-using-pandemic-to-step-up-migration-restrictions. Acesso em: 23 ago. 2020.
MPDFT. Coronavírus: MP emite nota técnica sobre acolhimento de imigrantes e refugiados durante pandemia. 2020. Disponível em: https://www.mpdft.mp.br/portal/index.php/comunicacao-menu/sala-de-imprensa/noticias/noticias-2020/noticias-covid/12159-coronavirus-mp-emite-nota-tecnica-sobre-acolhimento-de-imigrantes-e-refugiados-durante-a-pandemia-no-df. Acesso em: 23 ago. 2020.
ONU. Mais de 2 bilhões de pessoas no mundo são privadas do direito à água. 2020. Disponível em: https://nacoesunidas.org/mais-de-2-bilhoes-de-pessoas-no-mundo-sao-privadas-do-direito-a-agua. Acesso em: 20 ago. 2020.
UNICEF. Refugiados e migrantes da Venezuela: esquecidos no meio da pandemia. 2020. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/refugiados-e-migrantes-da-venezuela-esquecidos-no-meio-da-pandemia. Acesso em: 23 ago. 2020.
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